O Presidente da Junta de Freguesia de Benfica acusa a PSP de multar e bloquear veículos em pacatos bairros residenciais por “encomenda” . De quem? Da empresa que gere o parque de estacionamento local. Parece uma “acção comercial”, lamenta o autarca local.A PSP e o estacionamentoUm condutor criticar a PSP depois de esta lhe ter multado e/ou bloqueado o automóvel é uma situação apenas corriqueira no agitado quotidiano das grandes cidades. Mais raro (e preocupante?) é quando o dedo acusatório é apontado por um responsável autárquico. Mas foi justamente isso que aconteceu na localidade de Benfica, em Lisboa.
Há poucas semanas, o presidente desta junta de freguesia, Domingues Alves Pires, viu-se confrontado com a fúria da população local, reunida às portas da autarquia. Qual o motivo? Simples: segundo gritavam, teria sido ele o mandatário dos autênticos raides que a Divisão de Trânsito da PSP havia feito, nos últimos dias, multando e bloqueando em pacatas zonas residenciais (a saber: Av. Gomes Pereira, Rua Dr. João de Barros, Rua Maria Pimentel Montenegro, Rua Coronel Santos Pedroso e Rua República Peruana).
Todos eles bairros onde a população estacionava
“há mais de trinta anos sem quaisquer tipos de problemas”. Antes de mais, o autarca exigiu que lhe respondessem a uma pergunta: porque seria ele o responsável? De acordo com a resposta dos queixosos, o seu nome fora avançado pelos agentes da PSP, porventura para acalmar os ânimos, enquanto decorria a ofensiva bloqueadora...
“Caça à multa”, diz eleIrritado com a difamação e também com a medida, que classifica de
“caça à multa”, Domingues Alves Pires tratou de colar inúmeros “avisos” nas zonas em questão, onde explica, preto no branco, que estava contra esta iniciativa. E, depois, seguiu no encalço das explicações da PSP para o sucedido:
“Tomei a iniciativa de entrar em contacto com as autoridades porque achei uma brincadeira de muito mau gosto desculparem-se com o meu nome. E também porque considero que teria sido muito mais útil uma acção de sensibilização junto destes moradores, avisando-os de que, a partir de determinada data, passariam a multar. Até porque o estacionamento ali é inofensivo. Estamos a falar de espaços com sete metros de largura que não incomodam ninguém. Eu próprio deixava lá o meu carro, antigamente. As pessoas nunca haviam passado por isto. É uma acção desproporcionada”, referiu-nos o responsável pela freguesia de Benfica. Teve direito a resposta. Mas o que se segue não deixa de ser um retrato alarmante do país...
Troca de correspondênciaNa carta enviada à PSP, além de expor as suas críticas face a uma acção
“imoral”, Domingos Alves Pires pergunta se esta corporação e os seus agentes não norteiam as suas acções por
“princípios de carácter e integridade”, em vez de
“invocarem terceiros que nada têm ou tiveram a haver com elas”. Neste ponto, o presidente da junta de Benfica referia-se ao facto de terem mencionado o seu nome na acção.
Contudo, a resposta da PSP, a que a nossa revista teve acesso, deixou-o ainda mais perplexo. Começa, pacificamente, por invocar o artigo 49.º do Código da Estrada (CE), referente ao “estacionamento irregular em passeios ou locais destinados ao trânsito de peões”. Mas depressa resvala para o reconhecimento da existência de um mandatário (que não o autarca) ao referir que não poderão deixar de
“atender aos princípios de oportunidade e boa fé, como provam as reclamações de cidadãos que circulam nos arruamentos referidos, nomeadamente a exposição que nos foi enviada a esta Divisão de Trânsito pelo Condomínio da Rua Coronel Santos Pedroso, n.os 11 e 11-A, a Auto Silo – Benfica”.
Expliquemos melhor, para que não haja dúvidas: a Auto Silo – Benfica é uma empresa gestora de um parque de estacionamento situado no local da intervenção da PSP... Na carta endereçada à PSP (também na nossa posse), esta empresa argumenta que tem capacidade para duzentas e cinquenta viaturas, distribuídas por três pisos, e denuncia o
“continuado e abusivo estacionamento de veículos”, que, segundo defende,
“impedem gravemente, durante a noite e, por vezes, também durante largos períodos do dia, o livre e normal acesso das viaturas que utilizam os estacionamentos da Auto Silo”.
Um pedido de plena “boa fé”, tal como mencionado pela PSP:
“(...) além de criar evidentes prejuízos diários no trânsito rodoviário e pedonal, poderá resultar em algo de mais grave se tivermos em conta a impossibilidade de circulação de veículos de socorro, nomeadamente bombeiros, ambulâncias, etc.”, pode ler-se.
Uma semana foi o tempo que a PSP demorou a responder ao pedido da Auto Silo para multar e bloquear os veículos mal estacionados nas suas imediações“Este pedido só pode explicar-se por eles não terem muitos clientes! Vai daí, toca a multar! Que eles queiram fazer negócio, tudo bem, mas que a polícia se preste a estes trabalhos encomendados é lamentável! Trata-se de uma acção comercial: uma empresa que quer rentabilizar o seu negócio e o encomenda à PSP”, acusa Domingos Alves Pires, acrescentando que estamos perante uma acção que
“abre espaço a todo o tipo de dúvidas e desconfianças da parte da população, pois a denúncia é da parte interessada”.
PSP aceita pedidosEm género de conclusão, a carta da Auto Silo adquire contornos imperativos:
“Em face do exposto solicitamos a V. Exa que se digne a proceder em conformidade”. Observada a data desta carta (23 de Janeiro de 2009) e a da acção da PSP (29 de Janeiro de 2009), a nossa revista ganha alguma esperança na denúncia que aqui passamos a expor: em Lisboa, as Av. João Crisóstomo e Miguel Bombarda (para não ir mais longe do que as duas artérias que ladeiam as instalações da AutoMotor) estão diariamente pejadas de veículos estacionados em segunda fila. Agradecíamos que resolvessem o assunto com alguma prontidão, já que a circulação nestas artérias é muito prejudicada.
Aproveitamos a ocasião para solicitar o envio dos vossos agentes para a zona da Alameda D. Afonso Henriques, onde se verificam várias infracções ao artigo 49.º do CE, por vós referido, como sejam veículos estacionados em cima do passeio e a menos de cinco metros das passadeiras. Situações muito perigosas para os automobilistas e, sobretudo, para os peões. É certo que os lugares em questão pertencem à EMEL, mas acreditamos que não deixarão de olhar pela segurança da população com o mesmo zelo.
Gratos pela atenção.
Já agora, e para que o leitor possa participar nestes actos de “boa fé”, aqui fica a morada para onde poderá fazer chegar os seus “pedidos”: Av. Maria Madalena Vieira da Silva, n.º 48, 1759-184, Lisboa. Faça-o à atenção do Comandante da Polícia de Trânsito de Lisboa. No prazo de uma semana, tais problemas estarão solucionados.in
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